O cenário digital global tem sido palco de intensos debates sobre a regulamentação das big techs. No Brasil, uma proposta polêmica e inovadora tem ganhado destaque: o Projeto de Lei Complementar (PLP) 157/2025, conhecido popularmente como “PL Elon Musk”. De autoria do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), este projeto visa criar uma Contribuição Social Digital que faria gigantes como Google, Meta (Facebook, Instagram, WhatsApp) e X (antigo Twitter) pagarem pelo uso dos dados de usuários brasileiros.
O Futuro da Soberania Digital e o Valor dos Seus Dados
O Projeto de Lei Complementar propõe a criação da Contribuição Social Digital (CSD), um novo imposto sobre a receita bruta de grandes empresas de tecnologia, as chamadas ‘big techs’. Este PLP também introduz um instrumento de transferência de renda, popularmente conhecido como ‘PIX das big techs’. O principal objetivo desta proposta é financiar iniciativas cruciais para o fortalecimento da infraestrutura digital brasileira, o desenvolvimento tecnológico e a capacitação de usuários, além de promover redistribuição de renda para os usuários de plataformas digitais no Brasil./
O Que Propõe o “PL Elon Musk” de Guilherme Boulos?
O cerne da proposta é a criação de um tributo de 7% sobre a receita bruta de plataformas digitais com faturamento anual superior a R$ 500 milhões no Brasil. A arrecadação dessa contribuição seria distribuída em três frentes principais, buscando promover a justiça social e a soberania digital:
A parte mais comentada do projeto é a destinação de metade da arrecadação para os próprios usuários brasileiros. Inspirado no sistema PIX, seria criado um novo instrumento de transferência de renda que devolveria diretamente aos cidadãos uma parcela dos lucros gerados pelo uso de seus dados pessoais pelas plataformas. A ideia é que o valor gerado pelos dados dos brasileiros seja parcialmente redistribuído para a população que os gera.
Uma quarta parte do montante arrecadado seria direcionada ao recém-criado Fundo de Infraestrutura Digital Inclusiva (FIDI). Este fundo teria como objetivo financiar a construção e manutenção de infraestruturas públicas para armazenamento e processamento de dados. A iniciativa visa diminuir a dependência do Brasil de tecnologias e servidores estrangeiros, garantindo maior controle e segurança sobre as informações dos cidadãos e evitando possíveis ingerências ou “sabotagens” de governos extrangeiros.
Os 25% restantes da arrecadação seriam destinados ao Fundo Nacional de Cuidados Digitais (FNCD). As finalidades deste fundo incluem:
- Fortalecimento da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD): Órgão essencial para fiscalizar e garantir o cumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
- Financiamento de programas de proteção a crianças e adolescentes nas redes: Com foco em criar ambientes digitais mais seguros para os jovens.
- Combate à desinformação (fake news): Investimento em iniciativas e ferramentas para mitigar a propagação de notícias falsas.
- Auditorias independentes de algoritmos: Para assegurar a transparência e coibir práticas prejudiciais ou enviesadas por parte das plataformas.
O que é a nova Contribuição Social Digital (CSD)? Entenda o Novo Imposto para Big Techs
A Contribuição Social Digital (CSD) é um imposto proposto que incidirá sobre a receita bruta de empresas de tecnologia, com foco em atividades específicas. As principais fontes de receita sujeitas à CSD incluem:
• Publicidade Digital: Serviços de veiculação de publicidade em meio digital que utilizem dados coletados de usuários brasileiros.
• Venda de Dados: Venda ou transferência de dados gerados por usuários localizados no Brasil ou coletados durante o uso de uma plataforma digital.
Serão considerados contribuintes da CSD as pessoas jurídicas, tanto domiciliadas no Brasil quanto no exterior, que tenham auferido uma receita bruta global superior a R$ 500.000.000,00 (quinhentos milhões de reais) no ano-calendário anterior. Para a apuração desse limite, será considerada a receita bruta de todas as empresas que integrem o mesmo grupo econômico. Os contribuintes terão a obrigação de apresentar relatórios trimestrais detalhados à Secretaria da Receita Federal, contendo informações sobre as receitas e outros dados relevantes para a fiscalização da CSD.
A alíquota da Contribuição Social Digital (CSD) foi estabelecida em 7% (sete por cento) sobre a receita bruta das empresas de tecnologia. A apuração dessa contribuição será realizada trimestralmente, e o pagamento deverá ser efetuado até o último dia útil do mês subsequente ao do encerramento do período de apuração. O PLP 157/2025 também prevê a possibilidade de creditamento da contribuição incidente sobre os serviços dos quais o contribuinte seja tomador, com um prazo de validade de seis meses para que esse crédito seja utilizado na compensação da CSD devida.
Como a CSD Será Distribuída? Fundos e o Inovador PIX das Big Techs
Os recursos arrecadados com a Contribuição Social Digital (CSD) serão distribuídos em três pilares estratégicos, visando o desenvolvimento digital e a justiça social no Brasil:
1.25% para o Fundo Nacional de Cuidados Digitais (FNCD): Este fundo será crucial para o financiamento de iniciativas de capacitação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e dos próprios usuários em tecnologias digitais. Inclui programas de proteção de dados pessoais, segurança digital, combate à desinformação e auditorias independentes de algoritmos em plataformas digitais que utilizam dados de usuários para publicidade segmentada.
2.25% para o Fundo de Infraestrutura Digital Inclusiva (FIDI): Com foco na soberania digital do país, o FIDI será destinado ao desenvolvimento de infraestrutura pública e comunitária para armazenamento e processamento de dados, além de fortalecer infraestruturas digitais públicas que adotem padrões tecnológicos em rede para o interesse público.
3.50% para o Novo Instrumento de Transferência de Renda ( PIX das Big Techs ): Esta é uma das propostas mais inovadoras do PLP 157/2025. Metade da arrecadação será destinada diretamente aos usuários de plataformas digitais no Brasil, por meio de um novo instrumento de transferência de renda. A regulamentação desse instrumento deverá considerar métricas que não estimulem a criação de novos usuários, especialmente crianças e adolescentes.
Os fundos (FNCD e FIDI) serão geridos por um conselho composto por representantes do Comitê Interministerial de Transformação Digital (CITDigital), entidades da sociedade civil, instituições acadêmicas, Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), Autoridade Nacional de Proteção de Dados Pessoais (ANPD), Agência Nacional de Telecomunicações(Anatel) e empresas públicas de tecnologia da informação.
Justificativa e o Impacto do PLP 157/2025: Por Que um Novo Imposto para Big Techs?
A justificação do PLP destaca a necessidade premente de corrigir a concentração de poder econômico e político nas mãos de grandes empresas da economia digital, como Google, Meta e X (antigo Twitter). As práticas dessas companhias têm gerado sérios riscos à soberania nacional e à própria democracia brasileira. O projeto argumenta que, ao explorar dados pessoais de usuários no Brasil, essas plataformas utilizam algoritmos e publicidade segmentada para manipular comportamentos, polarizar debates e maximizar lucros, sem uma contribuição proporcional para o desenvolvimento do país. Além disso, essas ações distorcem o espaço democrático, amplificando discursos de ódio e notícias falsas.
O PLP 157/2025 busca estabelecer uma tributação justa sobre o valor gerado pelos usuários, alinhando-se a modelos já adotados por países como Portugal, França e Espanha. A proposta visa assegurar que os benefícios da economia digital sejam efetivamente redistribuídos para fortalecer a cidadania, a democracia e a justiça fiscal no Brasil, promovendo assim uma economia digital mais justa e soberana.
Impactos Potenciais para Usuários e Big Techs no Brasil
Se aprovado, o “PL Elon Musk” teria impactos significativos:
- Para os Usuários: A principal mudança seria a possibilidade de receberem uma compensação financeira pelo uso de seus dados. Além disso, o fortalecimento da ANPD e os investimentos em cuidados digitais poderiam resultar em maior proteção e segurança online.
- Para as Big Techs: As empresas teriam um novo custo operacional significativo no Brasil, o que poderia gerar críticas e lobby contra a medida. No entanto, seria uma forma de as companhias contribuírem mais diretamente para o desenvolvimento social e digital do país.
É importante ressaltar que a tramitação de um Projeto de Lei Complementar é um processo longo e complexo, que exige debate e votação em diversas etapas no Congresso Nacional. A proposta ainda será analisada por comissões antes de seguir para votação em plenário.
O Futuro da Tributação Digital e o PLP 157/2025
Em suma, o PLP 157/2025 representa um marco legislativo fundamental para adaptar a legislação tributária brasileira à complexa realidade da economia digital. Ao propor a Contribuição Social Digital (CSD) e o inovador ‘PIX das Big Techs’, o projeto busca reequilibrar o poder das grandes empresas de tecnologia e garantir que a vasta riqueza gerada a partir dos dados dos usuários brasileiros seja revertida em benefício da sociedade. Mais do que uma simples medida arrecadatória, o PLP visa impulsionar o investimento em infraestrutura digital, fortalecer a proteção de dados e estabelecer um novo modelo de transferência de renda, contribuindo para a construção de um ambiente digital mais equitativo, seguro e soberano para todos os cidadãos do Brasil.
Será um novo Paradigma para a Economia Digital?
O “PL Elon Musk” de Guilherme Boulos adiciona uma nova camada à discussão sobre o poder das big techs e o valor dos dados pessoais. Ao propor que as empresas paguem diretamente pelos dados que utilizam, o projeto busca não apenas gerar receita, mas também instigar uma reflexão mais profunda sobre a relação entre usuários, plataformas e soberania nacional na era digital. O desfecho dessa proposta poderá moldar significativamente o futuro da economia e da governança digital no Brasil.